Michelle Garcia Winner, MA, CCC-SLP
Os amigos são aquelas pessoas que nos fazem sentir bem acerca de nós próprios. Ainda que isto seja uma verdade simples, fazer amizades é um processo complexo, principalmente para indivíduos com Síndrome de Asperger, para os quais a aprendizagem social é um verdadeiro desafio.
Os amigos são aquelas pessoas que nos fazem sentir bem acerca de nós próprios. Ainda que isto seja uma verdade simples, fazer amizades é um processo complexo, principalmente para indivíduos com Síndrome de Asperger, para os quais a aprendizagem social é um verdadeiro desafio.
Outro facto, que aprendemos ser verdade ao longo de anos a trabalhar com estes indivíduos e a discutir os seus desejos, é que todas as pessoas dentro do espectro do autismo querem que os outros sejam simpáticos com eles. Desejam construir amizades e não gostam de ter inimigos. Não são diferentes das pessoas neuro-típicas nesta vontade de criar e manter relações saudáveis. A diferença encontra-se na sua capacidade mental para a negociação subtil que as relações amigáveis exigem.
As crianças e os adultos com Síndrome de Asperger apresentam dificuldades na interpretação das mensagens sociais. Por outro lado, as mensagens que enviam aos outros são também, frequentemente, erróneas no que respeita às suas intenções. Mesmo os alunos com Síndrome de Asperger que apresentam um elevado padrão de funcionamento, não têm consciência de como as outras pessoas os percepcionam, e das mensagens sociais não intencionais que os seus actos transmitem aos outros. Por exemplo, podem não reparar que são vistos como mal-humorados ou antipáticos quando falham na utilização dos cumprimentos.
A nossa tarefa como pais e educadores é partir estes conceitos complexos em passos concretos e compreensíveis.
Para começar, falamos acerca dos locais e momentos em que nos encontramos envolvidos no pensamento social. Os nossos alunos (incluindo os adultos) normalmente julgam que o pensamento social só é usado dentro de uma interacção social como, por exemplo, num encontro com os amigos, num jogo, etc. É preciso gastar algum tempo a discutir este assunto para que os alunos comecem a perceber que o pensamento social está activo sempre que partilhamos o espaço com outras pessoas, mesmo que não haja lugar a uma comunicação directa. Quem é que não afasta o carrinho das compras no corredor do supermercado para deixar que outra pessoa passe? Isto é pensamento social.
O pensamento social não está activo apenas quando temos a companhia de alguém, mas sim em todos os momentos em que pensamos nas outras pessoas. Quando estamos sozinhos analisamos interiormente as interacções sociais do passado, tentando adivinhar se o outro percebeu as nossas acções da forma desejada. Quando realizamos que fomos mal interpretados ou que agimos mal, telefonamos ou enviamos um email, para clarificar a situação ou pedir desculpas. Aqui está o pensamento social a trabalhar!
O pensamento social domina a nossa mente durante o dia. Nós utilizamo-lo antes, durante e depois de um encontro social. Ajuda-nos a determinar de que maneira nos devemos comportar para que as pessoas tenham bons pensamentos a nosso respeito quando nos voltarem a ver. Se o nosso objectivo é ajudar os nossos alunos a serem melhores pensadores sociais, ensinar-lhes os comportamentos sociais não é suficiente. Também temos que lhes ensinar acerca das mentes das outras pessoas e dos seus pensamentos sociais.
Como? Uma estratégia útil com alunos do 2º ciclo e mais velhos é usar os Quatro Passos da Perspectiva. Esses passos ajudam-nos a reconhecer e considerar os pensamentos que temos acerca das outras pessoas e a ajustar o comportamento mesmo na ausência de comunicação intencional. Utilizamos estes quatro passos em qualquer interacção social:
Passo 1: Sempre que duas pessoas partilham um mesmo espaço, têm pensamentos uma acerca da outra. Eu penso a teu respeito e tu pensas a meu respeito.
Passo 2: Eu considero as motivações e intenções do outro. Se o seu aspecto for suspeito, observo-o com um maior cuidado. O outro, por sua vez, também considera as minhas intenções e motivações.
Passo 3: Eu considero o que a outra pessoa pensa a meu respeito. Será positivo, neutro ou negativo? Existe alguma história entre nós que faça com que tenha esses pensamentos?
Passo 4: Eu observo e, possivelmente, modifico o meu comportamento para fazer com que a outra pessoa se mantenha a pensar em mim da forma que eu quero. O outro está a fazer a mesma coisa comigo.
Estes quatro passos acontecem em milésimos de segundos e a um nível intuitivo, abaixo do patamatar da nossa consciência imediata. Os três primeiros passos envolvem o pensamento social, apenas o último envolve o comportamento.
Durante as conversas com os alunos, é necessário frisar que este processo está baseado no princípio de que de que todos nós desejamos que as pessoas tenham pensamentos razoavelmente agradáveis a nosso respeito, mesmo num breve encontro. De outro prisma, o oposto disto também é verdade: não queremos que as pessoas tenham pensamentos estranhos a nosso respeito. Pode ser um desafio, para os nossos alunos, perceber que os outros têm pensamentos diferentes, e que todos nós temos pensamentos bons e estranhos acerca das outras pessoas. A maior parte dos alunos com Síndrome de Asperger nunca parou para pensar que também eles têm pensamentos estranhos acerca dos outros.
Muitos dos nossos alunos nunca consideraram o papel das memórias sociais nas suas interacções diárias. Todos nós temos memórias emocionais de pessoas, baseadas naquilo que nos fizeram pensar delas ao longo do tempo. Pessoas que levam os outros a ter pensamentos "bons" ou "normais" a seu respeito são frequentemente consideradas simpáticas ou amigáveis e têm mais hipóteses de fazer amigos do que aquelas que criaram uma série de memórias estranhas nas mentes dos outros. Durante o ensino do pensamento social, não só ajudamos os nossos alunos a perceber que são responsáveis pelo seu comportamento, como que as pessoas guardam memórias sociais acerca deles. A razão que me leva a ligar a um colega de trabalho ou a um amigo para pedir desculpas pela forma como as minhas acções podem ter sido interpretadas é fazer com que, no seu cérebro, se construa uma memória social positiva a meu respeito.
Os quatro passos da tomada de Perspectiva acontecem sempre que partilhamos o mesmo espaço com alguém e são um requisito fundamental para o funcionamento de qualquer aluno numa sala de aula. Uma regra implícita nesse contexto é que todos os alunos e professores devem partilhar um pensamento social mútuo acerca dos colegas e que cada aluno é responsável por observar e ajustar o seu comportamento de acordo com isso. Um aluno que não é eficaz nos quatro passos é normalmente considerado como tendo problemas comportamentais.
Os alunos que enfrentam desafios no pensamento social têm que aprender cognitivamente aquilo que nós fazemos de forma natural e intuitiva. Para ajudá-los a compreenderem a tomada de perspectiva, vamos estudar cada um dos quatro passos. Para que o educador seja capaz de compreender com uma maior profundidade este conceito, deve destinar tempo a observar os seus próprios pensamentos sociais e o impacto que têm nas suas acções, quando se encontra na presença de outras pessoas. Desta forma, o seu próprio pensamento social pode servir de guia no ensino dos alunos com Síndrome de Asperger. É comum que os professores vejam os seus alunos tornarem-se bastante interessados nos seus próprios pensamentos e nos pensamentos das outras pessoas, a partir do momento em que conseguem dividir o processo em componentes que possam ser observadas, acerca das quais se possa falar e relacionar com as experiências quotidianas.
Para promover o pensamento social nos indivíduos com Síndrome de Asperge, que apresentam uma inteligência verbal normal ou próxima da norma, é fundamental que não os ensinemos apenas a "comportarem-se" ou a "usarem as competências sociais adequadas", mas sim que o comportamento social é baseado no pensamento social.
No próximo artigo vamos tratar de um conceito "irmão" deste; os Quatro Passos da Comunicação.